quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

morre heleieth saffiotti, o que isso significa?

signifca a morte sucessiva de feministas na academia, e da nossa memória. Saffiotti era uma das que ainda resistiam, feministas na academia, em tempos de ESTUDOS DE GÊNERO, que não quer dizer necessariamente ESTUDOS FEMINISTAS. Inclusive o termo gênero foi uma forma de fugir ao estigma de feminismo e de 'neutralizar' o feminismo na academia, processo que chegou a denunciar em seu livro "Gênero, Patriarcado e Violência".

O que a gente tem, cada vez mais, é a produção incessante de um blabalbla vazio pós-moderno e inócuo, maior parte baseado em pensadores masculinos como Foucault, Derrida, Deleuze... Excelentes, incluisve, pelas éticas que preconizam, a ajudar na implantação do projeto [neo]liberal.

Por que assistiu-se, no mundo todo, a um declínio dos Women Studies, ou Estudos Feministas, assim como dos espaços de mulheres? Este ano também morreu Mary Daly, feminista radical, autora de Gin/Ecology, livro base da filosofia feminista radical. Conhecida também, polemicamente, pela proibição de homens nas suas aulas, política também seguida por Sheila Jeffreys. No ELFLAC este ano conversando com algumas ativistas, a política 'oculta' de algumas ativistas é tentar afastar os homens das aulas pelo conteúdo, já que por exemplo algumas universidades como a universidade autônoma do México proíbe esse tipo de política.

Os estudos de gênero proliferam, e dão carreiras pra odiadores de mulheres enrustidos, assim como lésbicas não identificadas com mulheres, que adotam um discurso pós-identitário ou queer, que desloca a questão da identidade política pra um marco novamente sexológico e individual. A identidade política foi substituída pela performance, não obstante algumas boas análises e contribuições dessas autoras como Judith Butler, ao falar da ininteligibilidade e da exclusão do simbólico que são condições que subjetivam sujeitos também denominados por ela de 'corpos abjetos', recusados da humanidade, como trans, drag queens, lésbicas, gays, a comunidade denominada 'queer' em geral, ampliando nossa compreensão.
Heleieth, para escrever sobre a violência, se voltou para as teóricas que chamou de anglo-saxônicas, as feministas radicais norte-americanas e inglesas (hoje sendo a austrália a maior parte dessa produção), assim como as materialistas francesas, que superaram tanto os feminismos da igualdade quanto os da diferença. Podemos dizer que se voltou para autoras que tivessem um marco de análise estrutural (Patriarcado-Capitalismo) e materialista (relações sociais de sexo - termo utilizado pelas francesas, que não usavam o conceito de gênero e que inclusive resistiram a ele. Mathieu: 'não é o gênero que cria o sexo, é o sexo que cria o gênero'. Rubin diz que existe um sistema sexo-gênero, eterno, straussiano, que sempre se produzirá significações de gênero sobre o sexo, o sexo é biologia e o gênero é cultura, por causa do parentesco).


Os estudos de gênero se desenvolveram em cima das autoras do feminismo da diferença, mais ligado à linguagem, e maior parte não feministas, e sim filósofas da linguagem que escreviam sobre o feminino. Julia Kristeva (base de algumas noções da Judith Butler), Helene Cixous, Luce Irigaray, e algo da Teresa de Laurentis (sujeitos ex-êntricos), influenciada por essas autoras mas ainda mais feminista radical, que primeiramente cunhou o termo 'teoria queer', abandonando anos depois dizendo ter sido coptado pelo neoliberalismo.
Então, o que eu tenho a dizer:

não tem mais visão estrutural da questão do Patriarcado, a gente tem que buscar isso lá antes, nos 70, 80, houve uma reação contra os movimentos radicais com a onguificação, com a cooptação dos fundos pra mulheres. Lendo o debate entre algumas feministas após o último ELFLAC, se disse que a Heterosexualidade Compulsória, na sua clássica definição, como sendo a dependência dos recursos masculinos sejam simbólicos ou econômicos, nos força relações de submissão a suas instituições e cultura. Os espaços de mulheres são diluídos, os fundos impôem linhas políticas às organizações feministas na américa latina, que são obrigadas a se tornarem LGBT, já que o trabalho feminista vai CONRTA o patriarcado e o capitalismo, e não a seu favor, saneando esses sistemas, que é o porque das ONGS serem apoiadas pelos estados ou então pelos fundos para mulheres ou lgbt do 1o mundo. A idéia dos fundos com, por exemplo, a exigência de diluir a identidade e corpo denominado mulher, não seria tentar adaptar as organizações de mulheres à organizaçÕes LGBT? Eles conseguem ao transformar as organizações de mulheres, não as lésbicas, agentes do desenvolvimento. 'Direitos Sexuais e Reprodutivos'. E mandam incluir as trans na agenda feminista. As estudiosas de gênero falam: que ultrapassadas somos, mulher não existe, é um discurso. Somos nós, as feministas e as lésbicas políticas, biológicas ou essencialistas. Ou não aceitamos as diferenças entre estes sujeitos. Sim, no neoliberalismo, somos extremamente únicos, já que se preconiza o indivíduo, e não as comunidades e coletividades, nesta ideologia que se impôe à nós sem sabermos, não porque fomos convencidos, mas porque consumimos e vivemos nas relações produzidas economicamente, porque fomos forçados a reproduzir essa ideologia pra podermos sobreviver. Afinal, o sujeito se faz até certo ponto, e o modernismo vende a ilusão de que o sujeito se faz independente das forças históricas, econômicas, sociais e relacionais.

Os ativistas queer oferecem o discurso anti-identidade como forma de resistênca à esse processo estatal. As identidades seriam forma de controle político e social sobre as comunidades. Só se faz política pública definindo identidades e corpos a serem fiscalizados, tratados e nomeados, então definidos, quando eram dissidentes das definições. Boa análise, compartilho.

Porém, eu me pergunto até onde a partir desse novo marco, se radicalizaria, já que não prevêm resistência coletiva, e sim individual. É possível fazer performance, mas unificar-se não mais, somos extremamente fragmentadas pelas nossas diferenças, pelas intersecções de raça, classe, etnia, cultura, e construção de significados dos nossos corpos. Somos só um pacote diluído, sem memória e sem discurso, de siglas. A ''questão de gênero e sexualidade". Essa questão enigmática. As minorias sexuais. Autônomas e flutuantes no espaço, dizem não ter sido subjetivadas por nenhuma categoria social, meros efeitos de discurso, micro-politizadas.
(a melhorar, isto é um rascunho pra não perder o momento já que escrevo minha monografia neste momento).